terça-feira, 8 de novembro de 2011

Seja Bem Vindo ao NOMA!

Fachada despojada do Noma: o melhor restaurante do mundo pela revista inglesa Restaurant (Foto: divulgação)


Quantos cozinheiros ao redor do planeta não sonham em estagiar no dinamarquês Noma, eleito o restaurante número 1 do mundo pela revista inglesa Restaurant ? E ter a possibilidade de, ainda que por um curto período, aprender com o chef René Redzepi, em Copenhague, as técnicas culinárias que colocaram a Dinamarca no mapa-múndi da gastronomia?
Pois bem, aqui mesmo em São Paulo, a chef Renata Vanzetto, dona do moderninho Marakuthai, conseguiu esse feito. Ela passou de 28 de junho a 15 de julho estagiando no Noma. Mais do que isso, levou junto a prima, Aline Camargo, responsável pelo bufê Marakuthai, em Ilhabela, para enfrentar o batente com ela. O restaurante consagrado recebe 25 estagiários de todas as partes do mundo. Dos colegas de Renata, 22 eram homens.

Aline Camargo, René Redzepi e Renata Vanzetto: o mestre e suas primeiras estagiárias brasileiras (Foto: divulgação)




O desejo aparentemente impossível de ser a primeira brasileira a estagiar no restaurante nórdico aconteceu mais fácil do que ela imaginou. Como? Renata resolveu desafiar a sorte em janeiro ao enviar um e-mail contando sua história e se candidatando a uma vaga. De imediato, recebeu uma resposta-padrão nada animadora: a fila era de dois anos e seu e-mail seria lido em até seis meses.
Um novo e-mail chegou no dia seguinte e, para surpresa dela, com boas novas. Tinham gostado do que havia descrito e queriam recebê-la o quanto antes. Foi assim que no final de junho a jovem de 22 anos embarcou para passar dezoito dias por lá. Bem, você quer saber qual é o e-mail? Ela jura que escreveu para noma@noma.dk.
Renata conta que as jornadas de trabalho eram longas, com cerca de dezesseis horas. “Ao fim do dia, me sentia exausta”, revela. Também fazia tarefas que quem tem título de chef não gosta de enfrentar. Encarregou-se “de limpar a cozinha e servir as mesas”. Também limpou navajas ou razor clams, deliciosos frutos do mar. “Era aflitivo, elas ficavam se contorcendo em nossas mãos.” Renata se lembra com mais saudade de colher ervas na praia e camomila selvagem num pasto.

Renata e um colega no campo: colheita de ervas usadas nos pratos (Foto: acervo pessoal)




Em suas palavras, essa foi uma “experiência surreal”, que ela decidiu compartilhar comigo e com você:

A chegada

Meu primeiro dia no Noma foi em 28 de junho. Esperava um ambiente formal, com pessoas mais velhas e com uma postura muito séria. Fui, porém, recebida por um rapaz jovem, com o corpo totalmente tatuado. Cheguei a achar graça da situação.

Os colegas

Os estagiários eram das mais diversas nacionalidades, pessoas de todo o mundo. No período em que estive estagiando, a equipe era composta por gente do México, Austrália, França, Itália, Estados Unidos, Irlanda, Japão e Espanha.

Tarefas de uma estagiária

Na parte superior do restaurante, localiza-se uma cozinha fria, na qual fica a maioria dos estagiários. Ali, são recebidos diariamente muitos brotos, flores e ervas. Estes itens são colhidos, muitas vezes, pelos próprios funcionários na área ao redor de Copenhague. Cabe aos estagiários limpá-los, uma tarefa que demanda cerca de seis horas.

Renata Vanzetto e outros estagiários em duras tarefas: seis horas limpando alimentos (Foto: acervo
pessoal)


Eu, por duas vezes, fui acompanhar e fazer a colheita de camomila selvagem. Encontrada em um campo de morangos, a camomila tem origem em um local incrivelmente lindo. Colher os ingredientes, que serão utilizados no preparo de pratos daquele mesmo dia, é incrível.

A importância concedida a cada item usado no restaurante é impressionante. Tudo é muito fresco. Justamente por isso, são pouquíssimos os ingredientes utilizados no Noma que também são encontrados no Brasil.

Passei por diversas tarefas, sempre como estagiária, desde limpar a cozinha, ritual que acontece cinco vezes ao dia, até servir as mesas. Fiz também produção e montagem de snacks na confeitaria. Eram servidos dez tipos diferentes antes do menu degustação.

Exclusividade e equipe

O Noma é um restaurante exclusivo. São apenas 35 lugares para os clientes. Mas a equipe que cuida de todos os preparativos é enorme, composta por 25 estagiários e mais de quinze cozinheiros. Dividido em várias áreas, cozinha quente, cozinha fria, confeitaria 1, confeitaria 2 e salão, o Noma dá início as suas atividades às 6h da manhã. Bem cedo, quatro funcionários começam a preparação dos molhos e pães.

O cliente é rei

A cobrança pelo serviço era rígida, estressante. Eram muitas responsabilidades e a pressão, enorme. Aconteciam três reuniões por dia com a equipe, uma antes do almoço, outra antes do jantar e a última, após o expediente. Nelas, recebíamos informações sobre os clientes, quem eles eram, o que comiam, o que não comiam, se eram novos na casa, tudo o que era possível para tratá-los como verdadeiros reis, o que é habitual no Noma.

Receitas em debate e a bicicleta

Uma curiosidade dos sábados à noite é a realização de um Project. Depois do serviço, quem quiser apresenta um prato, toda a equipe prova e debate sobre os ingredientes, consistência, sabores. É um exercício muito legal, um aprendizado sem comparações. Depois desse “ritual”, o René dá uma cerveja para cada um e vai embora de bicicleta. Esta situação, sim, é muito engraçada!

O número 7 do mundo

Ao descobrir que éramos brasileiras, eu e minha prima Aline, René mostrou-se surpreso. Não acreditou ser possível que nós duas o conhecêssemos. Parecia não ter ideia da fama que tem. Gostou muito de saber de nossa nacionalidade e aproveitou para dizer que admira Alex Atala – chef do restaurante D.O.M (eleito neste ano o sétimo do ranking da revista Restaurant).

Reconhecida por uma cliente

Em uma oportunidade fui servir uma mesa de brasileiros e uma das senhoras me reconheceu, falou sobre o meu restaurante, o Marakuthai. Foi ótimo, pois o René se interessou, acessou o Google e pesquisou sobre a minha história.


 por Arnaldo Lorençat

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